Após fuga de reeducando, relatório aponta castigos e retaliações no Presídio do Agreste

Por redação com TNH1 10/10/2022 18h06
Por redação com TNH1 10/10/2022 18h06
Após fuga de reeducando, relatório aponta castigos e retaliações no Presídio do Agreste
presídio - Foto: Reprodução

O relatório da inspeção feita em sete unidades do Sistema Prisional de Alagoas, divulgado na última sexta-feira, 07, pelo Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT), com apoio de integrantes da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil em Alagoas (OAB-AL), apontou uma série de irregularidades no Presídio do Agreste, unidade prisional que fica localizada no município de Girau do Ponciano.

Dentre elas, chamam atenção os relatos de castigos e maus-tratos aplicados aos reeducandos, que variam desde ficar mais de 45 dias sem direito a banho de sol, a beber água apenas durante as refeições.

Os relatos de maus-tratos e castigos surgiram em meio a recentes registros de fugas do Presídio do Agreste. Os inspetores descreveram (veja aqui o relatório completo) que logo após a captura de alguns dos fugitivos, foram aplicadas severas retaliações aos reeducandos.

"Houve uma fuga no Presídio do Agreste em 31 de julho de 2022, e alguns reeducandos fugitivos foram recapturados. Após a recaptura de alguns deles, foram aplicadas severas retaliações, violência física e privação alimentar durante dias. Todo módulo de onde provinham os fugitivos sofreu sanções coletivas como ficar mais de quinze dias sem visita. Encontramos pessoas que estavam na triagem-castigo-seguro há mais de 45 dias, sem direito de acesso ao banho de sol, nem a nenhum tipo de visita e/ou contato com a família, sem acesso a um livro para leitura. Ainda foi relatado que a água não é disponibilizada ininterruptamente, e que sua oferta é apenas nos momentos das refeições".

O relatório feito pelos órgãos ainda apontou que muitos reeducandos apresentaram problemas de pele, o que pode ter sido causado pela privação ao acesso à água.

"A equipe de inspeção constatou que muitas pessoas presas apresentavam problemas de pele. A privação de acesso à água pode levar ao desenvolvimento ou agravo de diversos problemas de saúde, desde aqueles associados à desidratação até aqueles relativos a doenças de pele, doenças infectocontagiosas e infecções por machucados, devido à dificuldade de higiene pessoal e do ambiente".

Celas sem energia elétrica - O relatório do MNPCT e da OAB-AL apontou que no dia da inspeção, o Presídio do Agreste tinha 1.035 pessoas privadas de liberdade, representando uma lotação de quase 108%. Além da superlotação, os responsáveis pelo levantamento constataram que as celas da unidade prisional não dispunham de pontos de energia. Outro problema apontado pelos inspetores foi a falta de ventilação em algumas celas.

"As celas dessa unidade não dispõem de pontos de energia e não há iluminação interna. Quando anoitece, as pessoas ficam numa total escuridão, sendo submetidas a tratamento cruel, desumano e degradante. Ainda obtivemos relatos de que as luzes são apagadas às 21h e que após este horário os PP’s, ficam monitorando os internos com a utilização de lanternas no interior das celas impedindo que eles tenham privacidade no momento de fazer suas necessidades fisiológicas, por exemplo"

"Todas as portas das celas são uma chapa de metal e possuem uma pequena portinhola que é aberta pelo corredor. Não há nenhuma abertura na porta ou na parede para que ocorra a ventilação cruzada dentro das celas".

Revistas e visitas de familiares - Os reeducandos do Presídio do Agreste também relataram aos inspetores incomunicabilidade em relação às suas famílias, sobretudo aqueles que se encontravam na triagem geral ou nas celas de triagem existentes nos módulos. De acordo com o relatório, a suspensão de visitas é uma medida disciplinar que parece ser amplamente utilizada na unidade.

"As pessoas que estão na triagem, em isolamento, em castigo, passam semanas sem contato familiar. 422. Os internos ainda informaram que há possibilidade de receber duas visitas mensalmente51, no entanto, apenas um adulto pode visitá-los, que é ilegal de acordo com a LEP, e o número de crianças é ilimitado. A duração da visita é das 9hs às 16hs e ocorre apenas no solário da unidade. Muitos internos falaram sobre os sentimentos de saudade de seus familiares já que podem ver apenas um(a) adulto(a) por visita. Adicionalmente, relataram episódios de angústia, ansiedade e ideação suicida. Eles ainda denunciaram sobre a realização de revista vexatória nos seus familiares e critérios arbitrários e subjetivos de proibição de ingresso de alguns visitantes por possíveis perseguições de alguns policiais penais".

Relatório faz recomendações após inspeção - O relatório faz 87 recomendações às autoridades do Estado, entre elas que seja realizado concurso público para reposição do quadro de Defensores Públicos, equipes de saúde, psicossocial e administrativas das unidades prisionais. À Secretaria de Estado de Ressocialização e Inclusão Social (Seris), o relatório recomenda também que "seja estabelecida imediatamente a separação das pessoas presas, provisórias e condenadas nas unidades, respeitando o que estabelece o art. 84 da Lei de Execução Penal".

O que diz a Seris - Diante da série de denúncias relatadas pelos reeducandos do Presídio do Agreste, a Secretaria de Estado de Ressocialização e Inclusão Social (SERIS) disse (veja abaixo) que as recomendações feitas pelos órgãos serão acatadas.

"A posição da SERIS é de que as recomendações serão acatadas e a Secretaria está empenhada em seguir com as medidas de reintegração social e melhoria da gestão do sistema.

A incorporação de cerca 300 novos PPs (policiais penais) será um dos diferenciais positivos.

O outro, ainda mais importante, será a entrada em operação do novo presídio, que fará com que Alagoas torne-se o primeiro estado brasileiro a não ter mais superlotação carcerária".

Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura - O Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT) faz parte do Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, de acordo com a Lei nº 12.847, sancionada no dia 2 de agosto de 2013. O órgão é composto por 11 especialistas independentes (peritos), que terão acesso às instalações de privação de liberdade, como centros de detenção, estabelecimento penal, hospital psiquiátrico, abrigo de pessoa idosa, instituição socioeducativa ou centro militar de detenção disciplinar. Constatadas violações, os peritos elaborarão relatórios com recomendações às demais autoridades competentes, que poderão usá-los para adotar as devidas providências.

Sua instituição atende a compromisso internacional assumido pelo Estado brasileiro em 2007 com a ratificação do Protocolo Facultativo à Convenção Contra Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes da Organização das Nações Unidas – ONU.

O sistema conta ainda com um Comitê Nacional de Combate à Tortura composto por 23 (vinte e três) membros, escolhidos e designados pelo Presidente da República, sendo 11 (onze) representantes de órgãos do Poder Executivo federal e 12 (doze) de conselhos de classes profissionais e de organizações da sociedade civil.