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A psicologia de 'A Morte do Super-Herói'

Por Luciano Felizardo 02/02/2023 21h09 - Atualizado em 03/02/2023 11h11
Por Luciano Felizardo 02/02/2023 21h09 Atualizado em 03/02/2023 11h11
A psicologia de 'A Morte do Super-Herói'
Imagem do filme A Morte do Super-herói - Foto: Imagem do Pinterest

A Morte do Super-herói, de Ian Fitzgibbon, é um dos meus filmes preferidos desde a primeira vez que eu assisti, ainda moleque, no ano que lançou (2012).

De primeira, o que me pegou foi a identificação. Um garoto mal-humorado que contava histórias desenhando heróis e que enfrentava um problema sério de saúde.

O que eu não imaginava na época, era que eu entraria no curso de psicologia, muito menos que veria teorias estampadas, pulsando vivas nesse filme.

Primeiro eu quero indicar a obra.

Nesse longa temos um protagonista, Donald, de 15 anos, que está no fim de seus dias. O garoto sofre com uma leucemia em estado já avançado, e tendo perdido as esperanças, passa seus dias tentando sentir o mínimo de dor possível. Pra isso, entre outras coisas, ele desenha personagens próprios, nos quais sublima suas angústias.

Meu choque inicial foi encontrar um "filme de doença" que soava cru. Não era uma pessoa prestes a ser canonizada, um menino que tinha decorado a bíblia de cabo a rabo e que ensinaria um belíssima lição aos seus entes queridos. Donald chora, grita, se lamenta, briga com os pais, e por vezes, se coloca em situações de perigo pra se sentir um pouco mais vivo.

Além disso, o longa dá vida aos desenhos do protagonista transformando eles em animação, e mescla isso ao live action de um jeito muito interessante.

Se você se importa com spoiler, sugiro que assista o filme e depois volte pra ler o resto. Eu, particularmente, acredito que a experiência de ver como acontece é bem mais importante do que saber o que acontece. Dito isso, é o seguinte:

Donald se apaixona por uma garota nova de sua sala de aula, Shelley, mas as coisas com ela não dão tão bem logo de cara, já que coisas consideradas "vergonhosas" do passado dela vêm à tona e Don reage mal a isso.

Por outro lado, seus amigos, que assistiam a ele morrendo aos seus olhos, decidem que o garoto não pode morrer virgem.

E deixemos isso em suspensão um pouquinho, porque é bem por aqui que a psicologia entra.

Você já ouviu falar da Logoterapia?
Essa escola teórica foi criada por Vitor Frankl, e tem como grande objeto de estudo o "sentido".

Frankl afirma que um dos maiores problemas da vida é quando não se vê sentido nela, e que os seres humanos não procuram a felicidade, procuram um motivo para serem felizes. 

Para Frankl, nós nem queremos fugir do sofrimento ou algo que o valha, só queremos um motivo para suportá-lo. Uma razão que nos sirva de norte.

Você pode perceber isso vendo pessoas ao seu redor, que suportam uma vida duríssima pela esperança de um pós-vida tranquilo e belo, ou mesmo de pessoas sem crenças religiosas, que frente à morte, se sentem satisfeitas por terem realizado sonhos, posto seus projetos em prática, amado seu cônjuge e filhos, etc.

Segundo Vitor Frankl, o sentido nos dá suporte para enfrentar a tríade trágica: dor, culpa e morte. No caso da morte, que é a tragédia do filme, Frankl a vê como incetivo para aproveitar a vida, vê a transitoriedade da existência terrena como motivo para se fazer o que se almeja e o que se precisa.

É o que nós vemos nesse filme. Donald segue o plano dos amigos e vai se encontrar com a prostituta que eles contrataram para desvirginá-lo antes que morra, mas quando ele percebe que seu fim está próximo, toma a decisão que mais se alinha com seu verdadeiro desejo. Don vai até a casa de Shelley, faz as pazes com a menina e a chama para um último passeio.

Eles caminham juntos, conversam durante toda a madrugada, e sabendo que era uma despedida, se beijam e se declaram um ao outro, sentindo gratidão pela oportunidade que tiveram de vivenciar aquele sentimento genuíno.

É um dos finais de filme mais bonitos que já vi. E sim, eu sempre fujo da ideia de "moral da história", mas é de nos fazer - no mínimo - pensar que, como não temos garantia de que dormiremos hoje e acordaremos amanhã, todo dia é dia de irmos atrás de nossas Shelleys.

Pensar sobre cinema e sobre psicologia serve pra isso também. Pra repensarmos nossas atitudes.

Luciano Felizardo

Luciano é escritor e sua cabeça gira em torno disso. Nesse espaço, vai falar sobre obras de arte (filmes, livros, músicas, etc) e as reflexões que teve a partir delas. Além de, vez e outra, tentar simplificar e trazer para o nosso cotidiano alguns conceitos de filosofia, política e psicologia - área na qual vem se graduando pela Ufal.
Suas obras podem ser adquiridas no site da Editora Ipê Amarelo ou entrando em contato com ele através do Instagram (@vezeoutrapoesia).

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