Estilista arapiraquense é sucesso no mundo da moda com peças que mostram o Nordeste

Por Gazetaweb 20/05/2018 14h02 - Atualizado em 20/05/2018 17h05
Por Gazetaweb 20/05/2018 14h02 Atualizado em 20/05/2018 17h05
Estilista arapiraquense é sucesso no mundo da moda com peças que mostram o Nordeste
Foto: Divulgação
Hoje, sonhar é necessário. O sonho foi meu combustível, e me fez atingir o que sou. Se você é do interior de um estado e quer ser um profissional da moda, acredite na sua capacidade e não ouça opiniões alheias. Assim, tudo que almejar, se realizará". A mensagem de incentivo é do estilista Jonhson Cavalcante, de 36 anos. Natural do Sítio Serrote, na Zona Rural de Arapiraca, o jovem deixou a "roça" para desbravar o Brasil com suas peças que encantam qualquer um.

Com criações ousadas, de cores alegres e com características do Nordeste, o jovem revelou que a aptidão para a moda vem de berço. A mãe dele, Marinalva Senhoria Cavalcante, de 59 anos, tinha como hobby a costura. Assim, observá-la trabalhando diariamente, despertou em Jonhson a vontade de criar. "Ainda criança, ficava brincando com os retalhos de tecidos embaixo da máquina de costurar da minha mãe. Aos sete anos, peguei a boneca da minha prima e fiz um vestido. Transformar um tecido plano em um produto acendeu em mim o desejo de ser estilista", relembrou.

No entanto, o que Jonhson não imaginava, era que para realizar esse sonho, vários obstáculos deviam ser superados. Filho de uma servidora pública aposentada, cresceu ouvindo que a profissão não era rentável, além conviver com a dura realidade do estado de Alagoas não contar com uma faculdade especializada em moda.

"Minhã mãe acreditava que para viver bem, o homem tinha que ter um emprego fixo e receber uma quantia x todo mês. Ela não queria que eu fosse autônomo, principalmente porque moramos em um interior. Porém, coloquei na minha cabeça que conseguiria e fui atrás dos meus sonhos em outro estado", contou o estilista.

Em 2010, acreditando no sucesso, chegou em São Paulo e logo ingressou na Universidade Bandeirante Anhanguera (UNIBAN). Matriculado no curso de Design de Moda, dividiu casa com amigos e foi trabalhar em uma confecção de roupas para custear as despesas.

"Em São Paulo a pessoa não vive e, sim, sobrevive. Para me manter na cidade e pagar minha faculdade comecei a trabalhar duramente. Saía de casa às 5h e só retornava por volta das 23h", contou.

As bonecas de Tieta

Após concluir a faculdade de moda no ano de 2012, Jonhson percebeu que precisava de mais. Decidiu encarar uma nova etapa e deu início a uma pós-graduação na Faculdade de Tecnologia Senai Antoine Skaf, também em São Paulo. Foi nesse período que, segundo ele, teve a oportunidade de participar de dezenas de concursos.

"Novos Talentos do Senai" que tem por objetivo estimular os estudantes a colocarem em prática os conhecimentos adquiridos em sua vida acadêmica, foi a primeira competição da qual participou. Desafiado a desenvolver uma minicoleção de moda, Jonhson apresentou para o país, em 2015, o trabalho "As Bonecas de Tieta" ,cuja inspiração foi a obra do escritor brasileiro Jorge Amado.

"Tirei umas férias em Maceió e aproveitei para ir a um restaurante regional da cidade. Quando cheguei lá, passou um filme na minha cabeça. Lembrei do interior em que eu nasci e cresci, e do trabalho na roça. Ao retornar para São Paulo e ser convidado para participar do concurso, já sabia o que criar. 'As Bonecas de Tieta' foi uma coleção que representou bastante o meu Nordeste", destacou ele, que subiu ao lugar mais alto do pódio.

Outro concurso que participou foi o "Brasil Fashion 2016", responsável por reunir os melhores alunos de moda de cada estado do país. Representando São Paulo, teve como orientador o estilista nacional Alexandre Herchcovitch. Juntos, eles desenvolveram a coleção "A Roça".

De acordo com Jonhson Cavalcante, foi com Alexandre que soube o significado de moda autoral. "Confesso que fiquei com medo de conhecê-lo. Eu o admiro muito e não queria desconstruir sua imagem. Vai que fosse chato? Mas, não! Ele foi atencioso comigo, me levou para conhecer sua loja e com seu estilo urbanista me ensinou a fazer uma moda autoral", contou o etilista, que descreve suas próprias peças como alegres e cheias de atitude.

Estilista conheceu a modelo Lea T em 2016

Antes de partir para o seu sonho em São Paulo, Jonhson Cavalcante precisou trabalhar na roça no Sítio Serrote, Zona Rural de Arapiraca. Sem perder o estilo, com chapéus e roupas customizadas, colhia fumo, macaxeira e feijão para o próprio sustento. O dinheiro, que às vezes aparecia, serviu para comprar tecidos e o ajudar a viajar.

Ainda no "Brasil Fashion 2016", além de Alexandre Herchcovitch, teve a oportunidade de conhecer a modelo transexual brasileira Lea T. Conforme o estilista, o encontro era esperado por todos que estavam no backstage do desfile.

"Quando me encontrei com Lea pedi um abraço e contei minha história de vida: o jovem que saiu da roça e conseguiu ser um profissional da moda. Ela, seu assistente e todos que estavam ao redor se emocionaram. E ainda por cima, foi Lea uma das modelos que vestiram minha coleção", ressaltou Jonhson Cavalcante.

No último dia 12, aconteceu em Fortaleza o "Dragão Fashion Brasil 2018". Idealizado por Claudio Silveira, a principal missão do DFB é lançar para o mundo estilistas e marcas comprometidas com uma visão mais autoral da moda.

"Renda-se ao Guerreiro"

Marcando presença, Jonhson desenvolveu uma coleção pra lá de especial. Intitulada como "Renda-se ao Guerreiro", ele apresentou peças que mostram a cultura nordestina. A renda e a dança folclórica foram os pontos chave do trabalho que precisou de três meses para ser finalizado.

"A coleção fala de render-se ao guerreiro. Render-se à cultura alagoana, à luta de todos os dias para ser alguém na vida, para realizar sonhos. É uma coleção para os que acreditam sempre", avalia Jonhson, quando perguntado sobre o significado do trabalho.

Ele também expôs que inspiração e criatividade para as peças se devem a artistas nacionais e internacionais como o estilista britânico Alexander McQueen e o brasileiro Jorge Feitosa, esse último, muito famoso por produzir nas roupas sua trajetória de vida.

De volta a Alagoas após oito anos em São Paulo, o estilista comenta que pretende montar um atelier em Arapiraca. Formar uma equipe e trabalhar com a cultura local também está em seus planos. "Voltei para minha terra e logo montei um atelier improvisado na casa da minha vó. Quero me organizar o mais rápido possível e começar a trabalhar com as rendeiras daqui. Elas fazem um bordado lindo, sem contar que temos nosso famosíssimo filé", salienta Jonhson, que si diz apaixonado por coisas populares.

Ele conta que foi convidado para a edição 2019 do "Dragão Fashion Brasil" e, com ajuda da mãe -que voltou a costurar só pra lhe ajudar-, já vem produzindo peças para serem comercializadas. 
Modelos com peças da Coleção "Renda-se ao Guerreiro" que representa o Nordeste