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Será que eu consigo? Acho que não! – Uma análise sobre o comportamento de autossabotagem.

21/08/2015 21h09
21/08/2015 21h09
Será que eu consigo? Acho que não! – Uma análise sobre o comportamento de autossabotagem.

 

Para entender melhor a temática peço a sua atenção, meu caro leitor, para as seguintes situações: 1) em algum momento você planejou fazer uma dieta para perder 5kg, porém, na primeira semana da dieta você foi convidado para a festa de um querido amigo que estaria cheia de guloseimas e que você não poderia deixar de ir. Pronto! Lá se foi sua dieta! 2) Já estudou bastante para uma prova que seria a porta de entrada para algo como um curso superior, um concurso público ou uma seleção de emprego. No entanto, na véspera da prova – que será às 8h da manhã – está passando na TV aquele filme que você gosta e que irá terminar por volta das 3h da manhã, você não resiste e infelizmente você não consegue ser aprovado porque estava muito cansado(a) para se concentrar nas questões. 3) Já manteve um relacionamento amoroso com pessoas complicadas e/ou indecisas que de alguma forma te trouxeram mais perdas do que ganhos e “inexplicavelmente” a outra pessoa com quem você veio a se relacionar mantinha o mesmo padrão comportamental que os anteriores. Será isso tudo culpa do cruel destino? Lamento em informar que não. Estes são padrões comportamentais que nós mesmos emitimos e que nos trazem prejuízos e que nos autossabotam.

Quando eu planejo fazer uma dieta e sucumbo ao primeiro obstáculo  neste caso, ir a uma festa de um amigo querido, não resisto e acabo comendo muito, o meu amigo querido em questão, além de querido é uma excelente desculpa para que eu não me sinta frustrado(a) por não ter conseguido manter a dieta. Se sei que tenho uma prova no dia seguinte pela manhã, logicamente não deveria dormir tarde, mas caso eu esteja com medo de falhar, o meu cansaço no dia da prova pode ser uma excelente justificativa para meu fracasso. Se tenho medo de permanecer em uma relação amorosa duradoura e com todos os conflitos que vem com o tempo, seria mais “esperto” de minha parte então, relacionar-me com alguém com o qual não terei motivos para continuar.

Em algum momento da sua vida você já apresentou comportamentos semelhantes a estes? Se sim, você está se autossabotando. A autossabotagem acontece quando o indivíduo apresenta um padrão comportamental que não traz ganhos verdadeiros, mas que é reforçado imediatamente, mascarando todo o prejuízo que aquele padrão inadequado vem trazendo à sua vida, como por exemplo, frustração, baixa auto-estima, sintomas depressivos e ansiedade. Nesse sentido: “Conclui-se que o conceito “inadequado” é aprendido pela pessoa a partir de regras emitidas pela comunidade social e pelas consequências que ela aplica aos comportamentos” (GUILHARDI, 2002).

Por que não percebemos que estamos nos autossabotando? A resposta é simples: às vezes são coisas tão pequenas e triviais que consideramos apenas como preguiça ou um momento de fraqueza, mas que na verdade são pequenas sabotagens. Como por exemplo: ter um mês para entregar um trabalho da escola ou da faculdade e mesmo assim não fazer, pois prefiro adiar, me envolver em coisas frívolas como redes sociais, televisão e até mesmo ver os filhotes da gata na casa vizinha, pois tudo se torna mais interessante do que terminar aquele trabalho. Ou seja, procrastinamos[1] mesmo que isso nos venha a trazer prejuízos futuros. Assim:

Quando o indivíduo não reconhece que seu comportamento é “inadequado” [...], não se sente “culpado” e não há, portanto, razão para se esquivar, já que não tem “expectativa” [...] de sofrer nenhuma consequência aversiva, pelo contrário, esperará uma consequência reforçadora positiva (GUILHARDE, 2002).

Nesse sentido, quando o sujeito não reconhece que esse comportamento é inadequado ele, possivelmente, continuará a apresentar este mesmo padrão comportamental, pois o mesmo não reconhece que os ganhos que obtém através deste padrão são mais nocivos do que benéficos.

Mas, e agora? Será que não tem jeito? Como faço para mudar esse tipo de comportamento? Bem, para mudar os nossos padrões comportamentais inadequados, precisamos identificá-los e analisarmos a funcionalidade destes comportamentos de autossabotagem em nossas vidas. Após fazermos isso, devemos buscar modificá-los substituindo-os por padrões mais adequados. Estes novos padrões não podem nos trazer prejuízos, mas sim ganhos a longo prazo.

Contudo, para algumas pessoas, apresentar uma postura de enfrentamento diante do problema é muito desconfortável, sendo mais cômodo permanecer com os antigos hábitos, pois para qualquer mudança efetiva de vida, necessitamos de tempo e esforço. O desgaste é aversivo e muitos não conseguem fazê-lo sem a intervenção de um profissional especializado. A terapia é um meio de auxiliar estas pessoas a enfrentar e modificar seu padrão comportamental de autossabotagem.

Por fim, para que mantenhamos qualquer novo repertório comportamental em nossas vidas, necessitamos de manutenção e fortalecimento do mesmo, ou seja, devemos nos policiar, buscar atividades que nos tragam benefícios, estar com pessoas que nos acrescentem algo de produtivo, ser indivíduos atuantes onde estivermos inseridos.

Encerro esse texto desejando a todos mais postura de enfrentamento diante das situações aversivas e menos fuga das mesmas. Agradeço a sua leitura e espero ter a sua atenção em outra oportunidade aqui no Além da Caixa.

 

Referências


BOLSONI-SILVA, Alessandra Turini  and  MARTURANO, Edna Maria. Práticas educativas e problemas de comportamento: uma análise à luz das habilidades
sociais.
Estud. psicol. (Natal) [online]. 2002, vol.7, n.2 [cited  2015-08-20], pp. 227-235 .Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php>

 

GUILHARDI, H. J. – Análise comportamental do sentimento de culpa. In A. M. S. Teixeira; M. R. G. Assunção; R. R. Starling; S. S. Castanheira (Orgs.), Ciência do comportamento – conhecer e avançar Vol. 1. Santo André: ESETec, 2002.







Cinthia Rafaelle Ferreira Lima

Psicóloga ClínicaComportamental
CRP15/3287




[1] http://www.jaenoticia.com.br/blog/175/Alem-da-Caixa. De acordo com o dicionário Aurélio, “procrastinar” significa “deixar para depois.

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O Além da Caixa é um espaço para a discussão dos mais diversificados temas sob a ótica da psicologia do comportamento. De maneira direta e com uma linguagem clara falaremos ao público em geral, mas sem destoar dos princípios da Psicologia Científica.
Seus responsáveis são os psicólogos comportamentais Cinthia Ferreira CRP 15/3287, Jacinto Neto CRP 15/3274, Jackelline Lima CRP 15/3275 e Renata Lopes CRP 15/3296, graduados em Psicologia pela Universidade Federal de Alagoas e pós graduação em Análise do Comportamento.
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